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Vida de Artista por Toulouse-Lautrec, Carybé e Eduardo Berliner


Quando menino devorava biografias de artistas, os grandes mestres da pintura, grandes homens e suas vidas atribuladas. Fazia o exercício de identificar paralelos com a minha humilde vida : técnicas, datas, nomes, amigos, hábitos, sonhos e motivações. Algumas biografias eu li inúmeras vezes em diferentes edições e autores, poderia listar várias aqui. Para ilustrar meu argumento evoco uma em especial :

Henri de Toulouse-Lautrec ( 1864–1901 ) >> família rica, herdeiro de uma linhagem aristocrática francesa, boêmio, desenhista, um dos primeiro cartazistas da história, ínicio da comunicação visual usando a desenvolvida cidade de Paris como suporte, usou litografia como técnica de reprodução gráfica, alcoolatra, morreu cedo, aos 36 anos e produziu mais de 5. 000 desenhos, 1.000 pinturas a oléo e 350 cartazes.

A vida do excêntrico “ enfant terrible “ povoava minha imaginação, meu paralelo era a lapa e santa tereza, minha bebida era cerveja e a técnica lambe — lambe. eu era menino romantizando a vida.

E continuava a devorar biografias, ao passo que conquistei certa maturidade nas pesquisas em arte, começei a alimentar uma curiosidade por artistas latinoamericanos, sobretudo escritores e pintores : garcia marquez, vargas llosa , jorge amado, pedro bandeira , almicar de castro, diego rivera, iberê de camargo, felipe ehrenberg e outros. Essas leituras materializavam-se em anotações diárias, e de um desses muitos cadernos cito uma fala capturada do polissêmico Carybé :

“ sou um operário do pincel e trabalho uma média de 14 horas por dia e não me desligo. é um trabalho que continua na cabeça, de noite. a famosa vida de artista é filha da mãe de trabalho, não tem nada ver com a que o pessoal pensava em 1890, de toulose — lautrec, de farras, músicas e cabaré. O que existe é trabalho, treino, porque, se você pára de trabalhar, esquece, perde a prática. para mim, inspiração é o dia em amanheço melhor e as coisas saem com mais facilidade. Artista tem que dormir as horas necessárias e se alimentar bem”.

Carybé fazia etnografia com seu repertório pictórico, um pesquisador criativo atento ao ambiente que estava inserido. um artista profissional. Uma biografia que mexeu com meus parafusos mais profundos, queria viver na bahia descrita por jorge amado, sonhava com cheiro de cacau, suor das mulatas e terreiros de candomblé. Carybé me apresentou a história do meu povo.

Ao passo que as pesquisas avançavam e meu arsenal de ferramentas de expressão aumentavam, minha curiosidade buscava novas hospedagens , novas biografias me intrigavam.

Eduardo Berliner (1978 ) . pintor, designer e tipógrafo. um “ótimo colorista”, “com domínio total da técnica” e “talento genial” segundo Hans-Michael Herzog, curador da extinta Casa Daros.

Masters of Arts in Type Design na Universidade de Reading ( Reino Unido ), Berliner é uma linha em construção na arte contemporânea, seu trabalho em pintura é resultado de uma pesquisa imagético imensa, como o próprio afirma : “ A obra é, por fim, uma mistura do que é muito íntimo e de problemas específicos da pintura.”

Essa afirmação me lembra um texto de outro artista cativante, Almicar de Castro, que sempre evoco em momentos de estranheza criativa :

“ O que caracteriza um artista é ele olhar para dentro de si mesmo. Toda experiência em arte é um experimentar-se, é a experiência de si mesmo, é uma pesquisa em você mesmo. “

Vida e Obra. E assim, uma nova modalidade de biografias preenchiam meus cadernos de anotação, Berliner é exemplo de um tipo diferente de artista, não quero gerar classificações, não pretendo cunhar definições, apenas analisar. Em 2012, na vigésima sétima edição da bienal de são paulo, apresentou mais de 80 cadernos de desenho resultado de uma década de trabalho. Isso é trabalho em arte. Volume de trabalho com intuito de gerar repertório, vocabulário e discurso.

Artista de ateliê , sem folga , um colecionador de percepções do mundo !

Toda essa reflexão aciona minhas reminiscências do curso Estudo do Plano com a querida professora Cristina De Pádula Cattan, no Parque Lage | Escola de Artes Visuais . Arte é Comunicação, Arte é Trabalho, Arte é Ciência e Ciência que produz e responde aos seus princípios constitutivos.

Continuo me alimentando de biografias.

Os artistas hoje, na era da informação, são como os alquimistas de um tempo passado, porém dedicam suas horas para manipular conceitos ao vez de compostos químicos. Geram questões ao vez de explosões. Deslocam, agrupam, reposicionam ideias, geram inquietações. Um trabalho simultaneamente braçal e intelectual desdobra-se de um exercício mental constante e inventivo.

A boêmia se resumi a doses controladas de ácido lisérgico acompanhado de suco de laranja e um álbum de jazz fusion pela manhã, tarde e noite.

> rodrigorosm.com


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